A possibilidade do ordenamento jurídico brasileiro conviver com dois princípios que, em um primeiro momento, podem ser vislumbrados como antagônicos, evidencia, na verdade, a preocupação do estado em tutelar direitos que, antes de serem caracterizados erroneamente como conflitivos, devem ser vislumbrados como princípios complementares. O tema em questão tem sido debatido apaixonadamente no parlamento brasileiro, especialmente em virtude de já estarmos vivendo em período pré-eleitoral. Neste sentido tramita na Câmara dos Deputados uma proposição que almeja impedir a candidatura de cidadãos que estejam respondendo a processos na seara criminal. Isto significaria, segundo os seus defensores, uma medida eficaz no processo de seleção de candidatos a cargos eletivos que, teoricamente, representariam o povo sem se resvalarem em questões morais e éticas.
A idéia em si parece boa e tende a contar com o apoio maciço da população. Além do apoio popular, tratar-se-ia de uma medida já adotada em vários países. A França, por exemplo, e, recentemente, a Espanha, negaram a candidatura de indivíduos que respondiam a ações criminais, independentemente da lide ter transitado em julgado.
Segundo, ainda, os proponentes, a ineficácia do princípio da celeridade no Judiciário brasileiro justificaria a adoção de tal postura. A doutrina nacional é clara a esse respeito e se opõe a este tipo de discurso que, sob a pretenção de resolver problemas sociais antiquíssimos, se envereda em defender psoturas que não levam em consideração uma série de variáveis intervenientes.
De fato, o princípio da ampla defesa e do contraditório é um instrumento de amparo, de salvaguarda das partes, seja no âmbito civil ou penal.
A presunção da inocência não deve ser vislumbrada como um elemento negativo e problemático, mas como um princípio de tutela, de defesa do cidadão comum a qualquer pretensão totalitária por parte do Estado, o que poderia nos conduzir a regimes políticos excessivamente centralizadores e pouco democráticos.
É evidente que o Judiciário do país tem por obrigação exigir mudanças no corpo legislativo afim de que a atividade judicante alcance um padrão de excelência quanto aos critérios de celeridade e aplicabilidade da própria decisão judicial. Isto implicaria, por exemplo, que as possibilidades processuais de recursos de recursos fossem restringidos, o que se trata de uma outra questão que não será aqui abordado. A questão, em suma, é questionar se a defesa apaixonada do princípio da celeridade e efetividade do processo deve nos levar a alçá-la ao posto primeiro dentre os princípios informadores, relegando o princípio da ampla defesa e do contraditório a um segundo momento. Penso que a concepção hegeliana de discurso permanece sendo tão válida quanto outrora. Onde há produção de discursos há diáletica, o que evidencia a necessidade de tempo na apreciação da lide. Neste contexto, é tarefa do juiz transitar harmoniosamente entre estes dois pólos, evitando, a todo custo, apoiar-se, exclusivamente, em um único princípio.
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