Hobbes parte do princípio de o estado permanente de conflito entre os homens -- todo contra todos (Bellum omnia omnes) -- é resultante do estado natural das coisas, ou seja, da possibilidade real de qualquer homem se apropriar de tudo. Hobbes concebe esse mover-se em direção ao seus interesses de "direito". Em outras palavras, no estado natural, é direito do indivíduo ter direito a tudo. O problema é que as coisas são escassas, o que faz com que o direito ilimitado do homem e a insuficiência de bens que atendam a todas as aspirações resultem em confrontos de toda sorte. Hobbes aponta como solução para tal estado de desarmonia coletiva a figura do Leviatã, uma autoridade ou colegiado que, investido em uma autoridade inquestionável, rege a ordem social. Ao contrário de Maquiavel, que desenvolve seu conceito de ética política e, portanto, de cidadania dentro de uma margem muito mais livre (para ele a virtude não é um ato intrinsecamente bom, mas circunstancialmente adequado, justificada pela única ambição de garantir a manutenção do Estado), o Leviatã concebido por Hobbes, mesmo assumindo um poder absoluto, sua atuação é regida por leis. Há, portanto, uma limitação do exercício do poder. Hobbes, por exemplo, reconhece a existência de algumas garantias inegociáveis, ou se preferirmos, cláusulas pétreas que regerão a ordem social, como o direito à vida e o direito à propriedade individual. Observa-se, portanto, que dentro de sua linha de pensamento, a cidadania esta assentada em duas colunas: a) a existência de uma instituição ou de uma pessoa que exercerá o poder absoluto para o bem comum, tendo por premissa que, mesmo sendo de direito de todo homem arrogar as coisas para o seu sustento, a limitação destes bens provocam um estado permanente de desordem; b) a propriedade privada e outros direitos, garantidos por um ordenamento jurídico, garante grande margem de segurança ao Estado e certa equidade aos seus cidadãos.
Marx, ao contrário, vislumbra o Estado burguês como força opressora. Sua superestrutura é o suporte para que a ideologia dominante se conserve no exercício do poder. Torna-se evidente que a concepção de poder em Marx está subordinada a dialética gendrada sob um olhar fortemente econômico: de um lado os que detêm o capital, ocupando o topo da pirâmide; do outro, os destituídos de qualquer bem de produção. Estes, evidentemente, como meio único de sobrevivência, oferecem sua única força, a de trabalho, para os primeiros. O conceito de mais valia nasce da constatação de que o preço pago pelo trabalho não condiz com o esforço empregado. Desse modo, a riqueza produzida é resultante de uma relação injusta, abominável, alimentada sempre pela lógica da demanda (quanto mais gente ociosa, menor o valor da mão de obra e, portanto, maior a margem de lucro). Ao contrário de Hobbes, que entende a propriedade privada como garantia de cidadania, Marx a percebe como fonte de desigualdades sociais. Para ele, a luta de classes tem sua gênese na concepção de direitos naturais incontestáveis e perpétuos, particularmente o de propriedade particular. Dentro dessa lógica injusta, a cidadania para o filósofo alemão só pode ser instaurada efetivamente se houver a supressão da sociedade de classes, o que, em si, implica no fim da propriedade privada. Se a visão de cidadania proposta por Hobbes está assentada no desejo primário de paz entre os homens, não entrando no mérito de classes ou estamentos de ordenação da sociedade, Marx nega a possibilidade de seu estabelecimento com a presença de um grande monstro, o Leviatã. Ao invés disso, a cidadania vai sendo forjada a partir de um caráter revolucionário, de luta, de oposição direta e sistemática com o Estado burguês.
Cristian Santos
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